Mas que um escritor tão puro quanto Virginia Woolf, que uma artista
tão empenhada em criar uma obra que retivesse somente a transparência, a
auréola luminosa e os leves contornos das coisas, tenha se sentido de
certa maneira obrigada a voltar para junto de si, num diário tagarela em
que o Eu se derrama e se consola, isso é significativo e perturbador. O
diário aparece aqui como uma proteção
contra a loucura, contra o perigo da escrita. Lá, em As ondas, ruge o
risco de uma obra em que é preciso desaparecer. Lá, no espaço da obra,
tudo se perde e talvez a própria obra se perca. O diário é a ancora que
raspa o fundo do cotidiano e se agarra às asperezas da vaidade. Da mesma
forma, Van Gogh tem suas cartas e um irmão para quem escrevê-las.
BLANCHOT, Maurice. O livro por vir. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p.273
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