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segunda-feira, 21 de outubro de 2013

O livro por vir

Mas que um escritor tão puro quanto Virginia Woolf, que uma artista tão empenhada em criar uma obra que retivesse somente a transparência, a auréola luminosa e os leves contornos das coisas, tenha se sentido de certa maneira obrigada a voltar para junto de si, num diário tagarela em que o Eu se derrama e se consola, isso é significativo e perturbador. O diário aparece aqui como uma proteção contra a loucura, contra o perigo da escrita. Lá, em As ondas, ruge o risco de uma obra em que é preciso desaparecer. Lá, no espaço da obra, tudo se perde e talvez a própria obra se perca. O diário é a ancora que raspa o fundo do cotidiano e se agarra às asperezas da vaidade. Da mesma forma, Van Gogh tem suas cartas e um irmão para quem escrevê-las.

BLANCHOT, Maurice. O livro por vir. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p.273

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